terça-feira, 26 de agosto de 2014

"Mankind is noodlekind"

Falar de ramen é quase entrar em um desenho animado japonês.

Ponyo ≤3

E não deixa de ser, já que esse prato é atualmente uma das bases da alimentação japonesa. É como o nosso arroz com feijão.


Um "Ramenya", restaurante de ramen em Kyoto
Photo by Japan Resor (CC BY-SA)

Mas ao olhar uma sopa com macarrão, é como pensar naquela canja que sua mãe fazia para você quando estava gripado, naqueles dias frios de inverno. Só que o ramen é muito mais do que isso, é ciência.

Primeiro, existem vários tipos de ramen, o macarrão em si. O fio pode ser fino ou grosso, e tem que ser um tipo especial para a sopa. Mesmo sendo feito com os mesmos ingredientes de um macarrão comum, farinha e sal, o ramen é feito com uma água especial, alcalina, que o faz firmar mesmo em um caldo fervente.

Miso ramen

E claro, o caldo. Em cada região japonesa, um tipo de caldo, um tipo diferente de preparo. Em Tokyo, se come o Tsukemen, em que o macarrão vem separado do caldo, que é quente e frio, preparado a base de molho de soja e frango. Em Hokkaido, o caldo é mais rico (pelo frio da região), feito a base de miso, um tempero de soja fermentado, frango e peixe. E em Fukuoka, o Tonkatsu, e o seu caldo é preparado a partir de ossos de porco, assados e cozidos por muitas horas. De todos, é o caldo mais rico e gorduroso.

Tonkatsu ramen

Além do macarrão e do caldo, os acompanhamentos variam de região. O básico dos ramens é o que aparece até mesmo no desenho de cima: pedaços de carne (geralmente barriga de porco), cebolinha e um ovo cozido de gema mole. Dependendo do estilo de ramen, tem as variações: milho doce, broto de bambu, broto de feijão e nori, a alga do sushi.

Tsukemen ramen

Historicamente, o ramen é um prato do início do século 20, que só se comia em ocasiões especiais. Em 1958, Momofuku Ando inventou o processo de fritar o macarrão para acelerar o processo de cozimento, e, além de popularizar, levou o "nissin" (o nome da empresa de Momofuku) para fora do Japão. O nosso bom e salvador miojo nasceu ali.

Momofuku Ando morreu aos 96 anos, com honrarias de estado. Isso prova que miojo é poder, saúde, riqueza e sabedoria. Momofuku, te amamos.

"seu" Momofuku, com um bom miojão nas mãos

Hoje, o ramen é visto pelos amantes da boa comida como um departamento mágico, pela profundidade de sabores em algo essencialmente básico na alimentação. E isso se reflete na imensidão de chefs que partem para o Japão para entender a magia por trás do ramen, e depois retornam para seus países de origem para reinventar o prato, ou tentar servi-lo da forma mais tradicional possível.

E foi isso que eu vi em Nova York. A cultura de ramen na cidade é imensa, e um dos restaurantes mais frequentados é o Hide-chan Ramen, que vende receitas tradicionais, em um ambiente totalmente japonês.

Ramen com caldo claro, base de molho de soja, direto de NY.

Eu, muito brasileira, com a mania de falar mais alto do que o normal, estava escolhendo o meu ramen no cardápio, quando um garçom se aproximou e, falando em português, perguntou se éramos brasileiros. Imagina só, brasileiros em um restaurante japonês em Nova York, conversando com o garçom. Isso que é globalização.

Fora isso, o tonkatsu deles é maravilhoso. Divino. De chorar. Cremoso, rico, com um chashu (a carne de porco) macio, enfim, que experiência. Marcelo foi em uma opção não-tradicional, chamado de Red Dragon e carregado na pimenta.

Red dragon e o tonkatsu lá no fundo <3

Ainda no oriente, na Tailândia também se come muito o tal do "noodle soup", a sopa de macarrão. É muito parecido, realmente. Troca-se o chashu de porco pela carne de pato fatiada, o caldo pesado por um caldo claro de soja e frango, e adicione uns dumplings (uns pastéis cozidos recheados de carne de porco). E claro, o bom e velho macarrão ondulado, o mais parecido com o nosso miojão.

O noodle soup tailandês

No oriente todo se come versões do ramen. Na verdade, tem quem diga que a origem do prato é chinesa, mas o japão se tornou famoso muito pela invenção do macarrão instantâneo, que popularizou e espalhou essa delícia pelo mundo.

Tanto é, que no Brasil você pode encontrar versões bem fiéis do original japonês. E, claro, um lugar que você pode ir é na Liberdade, na capital de São Paulo. Acessível é pouco.

o tonkatsu do Ramen Ya, na Liberdade

A Liberdade sempre foi o paraíso para quem gosta da cultura oriental, e em questão de ramen, não é diferente. O Ramen Ya, restaurante bem pequeno e muito frequentado por japoneses (acho isso fundamental, se eu for a única ocidental em um restaurante, já dou credibilidade) tem um preço muito honesto e porções grandes. O tonkatsu é muito bom, mas falta mais tempero. O ovo veio quase no ponto certo, e o macarrão tinha uma boa textura. No todo, foi uma boa experiência.

Tsukemen do Ramen Ya, na Liberdade

O tsukemen era uma porção estranha, com muito nori em cima. Mas o caldo era saboroso. De novo, falta mais tempero. Pra quem quer ter uma primeira opinião sobre o ramen, recomendo.

Existem outros restaurantes de ramen em São Paulo. Tem o Lamen Kazu e o Aska, na Liberdade. Recomendo os dois por razões óbvias: estão em um bairro frequentado por orientais, então a chance de ser bom é maior.

E pra quem pode ir a Nova York provar o ramen (o melhor da vida, até hoje), vá ao Hide-Chan. E ao Momofuku Noodle Bar, do David Chang.

Chang é um fanático por ramen, e em seu programa Mind of a Chef, foi ao Rokurinsha, no subsolo do metrô de Tokyo. Lá, o tsukemen é religião.

olha a fila pro almoço, e você aí reclamando do self service.
Foto: Gastrolust

Ramen é papo sério.